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  • by Brunelson

Revista Rolling Stone: confira o bate-papo na íntegra entre Dave Grohl e Ringo Starr


Beatles, Nirvana, Foo Fighters


Músicos sobre músicos: Ringo Starr & Dave Grohl


Dois bateristas que se transformaram vocalistas em suas próprias artes, perdendo John Lennon e Kurt Cobain e encontrando a vida após as suas lendárias bandas.


Ringo Starr está prestes a entrar em uma banheira sem água com Dave Grohl para serem fotografados pela revista Rolling Stone, mas Starr parece um pouco cético, dizendo: "Vocês estão armando algum tipo de besteira?", mas ele entra de qualquer maneira.


Logo, os 02 estão conversando confortavelmente e enquanto Grohl discute a turnê mundial recém-finalizada do FOO FIGHTERS, Starr entrega a ele um patinho de borracha e o instrui a fazer um símbolo do coração com as mãos, para complementar com o seu próprio onipresente sinal de paz com os dedos (paz e amor).


Grohl e Starr se conhecem desde 2013, quando Grohl discursou em uma festa de lançamento do 1º livro de fotografias de Starr. Mais tarde, Grohl recrutou Starr para tirar fotos do FOO FIGHTERS para o álbum "Sonic Highways" (8º disco, 2014).


Hoje, eles estão perto o suficiente para Starr tirar um sarro de Grohl sobre o seu tempo como fotógrafo do FOO FIGHTERS: "Eu nunca achei que você tivesse gostado", Starr provoca Grohl das fotos que ele tirou. “Do que você está falando?” Grohl responde, complementando: "Nós as usamos no disco!" Starr retruca: "Eu queria ter recebido mais elogios e amor de vocês".


Grohl aprendeu a tocar violão - o seu primeiro instrumento - estudando num livro de acordes dos BEATLES. Desde então, o seu arco de carreira reflete o de Starr de várias maneiras: ambos alcançaram a fama como bateristas em grupos que definiram gerações e se reinventaram como compositores e líderes de banda.


Starr acaba de lançar o seu 20º álbum solo, "What's My Name", e encerrou uma turnê com a sua banda de apoio, ALL STARR BAND, agora, em seu 30º ano. Os dois entraram em outras áreas artísticas fora da música - Grohl como diretor, Starr como ator e fotógrafo (seu último livro, "Another Day in The Life", acabou de ser lançado).


E ao longo do caminho, os dois artistas resistiram à perda para a tragédia de um amigo/colega de banda.


Enquanto conversam durante a próxima hora, os assuntos são pontuados pelo constante bater das mãos na mesa dos 02 bateristas. "Você vê", diz Starr, ironicamente, "quando tudo acabar, só irão sobrar 02 bateristas em cada banda e as pessoas irão nos culpar para sempre".


Confira na íntegra a entrevista e bate-papo que rolou entre Dave Grohl e Ringo Starr:



Dave Grohl: Você pode me explicar o que é o gênero musical chamado skiffle?


Ringo Starr: Skiffle é basicamente 01 acorde. O artista Lonnie Donegan teve vários grandes sucessos na Inglaterra, mas na verdade este estilo musical se originou na música caseira feita no sul dos EUA. Naquela época, se você pagasse 01 dólar, poderia entrar na festa e isso ajudaria o proprietário a comprar as bebidas e pagar o aluguel. Então, mudou-se para a Inglaterra, o que é bem estranho!



Grohl: Houve uma cena específica na Inglaterra?


Starr: Bem, ainda tinha uma sensação de agito em nosso meio, tipo, a mania do skiffle desencadeou com a canção de Donegan da música folk americana, "Rock Island Line", em 1956.


Na época, em Liverpool, éramos todos adolescentes e eu fazia qualquer coisa para não entrar no exército. Então, para me safar disso, acabei nas ferrovias. Consegui um emprego nesta fábrica e a minha 1ª banda foi formada nesta época, junto com um cara que morava ao meu lado, Eddie Clayton, que era apenas um guitarrista muito legal. Eu sempre quis ser baterista desde os 13 anos de idade e o meu amigo, Roy Trafford, fez um baixo por conta própria num baú, com uma vara e barbantes amarrados nele - isso é que era skiffle.



Grohl: Mas você não teve um treinamento formal?


Starr: Não... Tocávamos no porão da fábrica para os funcionários na hora do almoço e se você já tocou em uma fábrica, isso fará você crescer como músico e pessoa. Escutávamos direto alguém falando: "Vão embora!" Não há muitas frases do tipo: "Muito bom, rapazes". Sim, foi assim que eu comecei e então, introduzimos mais algumas pessoas à banda... Depois, entrei no grupo RORY STORM AND THE HURRICANES, que foi um rock incontrolável que fizemos. Esse foi um ótimo momento para mim e uma grande banda de Liverpool. Em 1960, consegui um emprego por 03 meses em um acampamento de férias. Eu saí da fábrica e toda a minha família teve uma reunião para tentar me convencer de que “a bateria é boa somente como hobby, meu filho..."



Grohl: Ah, eu também tive uma dessas... Quem eram os seus bateristas favoritos quando você era jovem?


Starr: Bem, o baterista de jazz, Cozy Cole, é o único que eu já mencionei em entrevistas, mas o baterista de Little Richard também, Charles Connor. Ele era outro baterista que ouvi na época e que apresentava seções de bateria com o chimbal fazendo parte do preenchimento! Tinha sido a 1ª vez que eu escutava aquilo.



Grohl: Acho que o chimbal é possivelmente a peça mais expressiva de uma bateria, seja abrindo e fechando ou criando uma dinâmica com ele. E é claro que você é famoso...


Starr: Por fazer cortes nele! De onde veio isso tudo?



Grohl: Eu não sei... Você parecia estar cortando um presunto na época.


Starr: Naquele tempo parecia bom.



Grohl: Com as bandas antes dos BEATLES, você já estava cantando alguma música?


Starr: Sim, no RORY STORM AND THE HURRICANES. Eu cantava junto nas músicas "Watch Your Step" e "Alley Oop". Quando íamos para a Alemanha, todos os alemães sempre diziam: "Spielen' Alley Oop". Você sabe, as substâncias químicas começaram a entrar em cena na Alemanha e aquilo foi bom. É claro, tinha muito álcool, mas as anfetaminas havia chegado e nos manteve acordados a noite toda.



Grohl: Eu aposto que sim... Quantos setlist você tocava em cada show?


Starr: No começo eram 03. Bruno Koschmider (empresário alemão, que contratou os BEATLES no início da década de 60) tinha 02 clubes, o Kaiserkeller, onde eu tocava com o RORY STORM AND THE HURRICANES, e o Bambi Kino, onde os BEATLES tocavam. Depois, ele fechou o Bambi Kino e levou os BEATLES ao Kaiserkeller. Nos fins de semana passávamos 12 horas entre as duas bandas, com cada uma tentando se superar. O rock and roll enlouqueceu, cara... Que vida.



Grohl: Eu pergunto sobre você cantando, porque os BEATLES - e me corrija se estiver errado - parece a 1ª banda a popularizar a ideia do baterista cantando uma das músicas do próprio grupo. Isso realmente já tinha acontecido antes?


Starr: Bem, não. Eu já fazia isso antes, então, não foi estranho quando comecei a fazer nos BEATLES. As 02 primeiras músicas que gravei com os BEATLES foram as canções do artista Carl Perkins, porque eu gostava de rockabilly e depois descobrimos as músicas country, coisas assim. E então, o pessoal dos BEATLES me deram uma música para eu cantar junto e depois comecei a compor canções. O interessante é que estou compondo melhor depois que a banda acabou.



Grohl: Bem, eu posso imaginar isso, porque você estava num grupo onde todos eram incríveis compositores...


Starr: Mas foi difícil... Me lembro que cantava para eles algumas coisas que havia composto, mas...



Grohl: Bem, essa é a famosa antiga piada, tipo, qual foi a última coisa que o baterista disse antes de ser expulso da banda? "Hey, pessoal, eu tenho uma música que acho que deveríamos tocar".


Starr: Bem, sim, eu costumava compor canções e apresentá-las aos rapazes, e eles rolavam no chão rindo...



Grohl: Em 2014, quando fomos ao 50º aniversário do The Ed Sullivan Show que você tocou, quando você subiu para tocar a música “Yellow Submarine”, eu honestamente acho que essa foi a maior reação do público naquela noite.


Starr: Sim, sim...



Grohl: Eu realmente acho que essa música definiu a vida de todos no mundo em algum momento - ou apenas se tornou um grande momento para as pessoas. Estou sentado cantando esta música com a minha filha de 05 anos e estamos cantando pela mesma razão, apesar de estarmos separados por 45 anos.


Starr: Eu acho que cheguei cedo às crianças com essa música, porque quando nos reunimos em família, todos começam cantando a frase: “Yellow Submarine”. Todos os meus netos ficam atrás da cadeira onde estou sentado e num certo momento, eles começam a cantar: "We all live in a yellow submarine". Querendo dizer, tipo: "Sabemos quem você é, vovô".



Grohl: Essa é uma pergunta estranha, mas o que você lembra de gravar aquela parte do filme em que todos estão na sala de máquinas de um submarino?


Starr: Estávamos no estúdio Abbey Road remasterizando e preparando o lançamento do álbum "Abbey Road". Se você olhar para onde as escadas descem, é onde costumávamos sair para dar um descanso e nos aconchegar. Tem uma porta grande e eu a abri e gritei de lá. John Lennon estava dizendo: "O que fazemos, capitão?" ou algo assim. Estávamos todos gritando e o colocamos no filme. Fizemos o que fizemos!


Eu acho que estava contando essa história para a capa do álbum "Abbey Road". Ficamos dias conversando sobre o assunto: "Vamos subir o Monte Everest e fazer a capa do disco!" "Vamos a um vulcão no Havaí!" "Egito, as pirâmides, sim!" "Ah, foda-se, vamos somente atravessar a rua". Naquela foto, não nos vestimos como se fosse uma sessão de fotos, sabe? Era daquele jeito mesmo que nos vestíamos para passar o dia e funcionou muito bem.



Grohl: Desde o início, a palavra "amor" sempre foi um tema dos BEATLES...


Starr: Ah, todas as músicas são de amor.



Grohl: Havia canções de amor para uma garota...


Starr: A música “I Want to Hold Your Hand".



Grohl: Mas em que momento a palavra "amor" se transformou nesse tipo mais universal de ideia espiritual?


Starr: Provavelmente por volta de 1967, quando estávamos gravando o disco "Revolver". Quero dizer, nós estávamos crescendo, mudando de opiniões e fumando maconha! As coisas começaram a ficar meio nubladas entre nós e acho que isso gerou grandes mudanças.



Grohl: Eu acho que o sinal de um grande baterista é saber quem é o baterista dentro de 08 compassos na música. Acho que esse é o objetivo e que muito disso tem a ver em ser autodidata, porque você estava apenas fazendo o que lhe veio naturalmente, então, não ficou restrito a nada. Até hoje, quando estamos no estúdio - e tenho certeza de que todas as bandas do mundo fazem isso - e pedimos um preenchimento na bateria, dizemos: "Hey, faça uma coisa de Ringo aí na bateria".


Starr: Bem, isso é um grande elogio vindo de você, Dave. Sabe, desde o início, o meu kit de bateria foi montado para a mão direita. Eu me sentava atrás dele e não me importava em ser canhoto. Fiz o melhor que pude de uma maneira canhota, o que, no final, foi ótimo para mim, porque de repente eu tive o meu próprio estilo. E o estilo era: sempre há alguns segundos antes que eu possa preencher. A única coisa que faço é escrever com a mão direita. Até para jogar golfe eu sou canhoto.


Mas Dave, você me surpreendeu muito quando fomos à festa do Grammy em 2016. Com quem você estava tocando? Com BECK?



Grohl: Sim, sim...


Starr: Porque estou tão acostumado com você... Tipo, eu sempre digo ao meu filho, Zak Starkey (que é o atual baterista do THE WHO desde 1996): "Você não precisa obter êxito com todos que você toca, mas você precisa obter êxito com todos eles tocando do jeito que você toca". E você tocou do seu jeito e foi lindo de ver!



Grohl: Obrigado, Ringo... Obrigado.


Starr: Eu estava esperando por esse agradecimento (aqui, Ringo começa a fazer uma bateria furiosa na mesa).



Grohl: Eu acho que, crescendo e aprendendo a tocar ouvindo os BEATLES e muito rock & roll, realmente entrei no ritmo antes de qualquer coisa. Por mais que eu ame e seja louco pelo punk rock e coisas muito rápidas desse tipo, para mim, a coisa mais importante sempre foi a sensação, o balanço ou a simplicidade de uma música, na qual ela serve apenas para fazer todo mundo se mexer.


Starr: Eu sempre pensei que é isso o que fazemos, de que os bateristas mantêm a música unida. Eu nunca quero me destacar sobre os vocais, sabe? Se alguém está cantando, ele não precisa de uma versão de "Drum Boogie" do baterista Gene Krupa (1941). E eu também não faço solos, porque nunca gostei de solos.



Grohl: Bem, lembro que já conversamos sobre isso uma vez. Eu acho que estávamos conversando sobre treinar, praticar...


Starr: Eu nunca treino.



Grohl: Nem eu! Porque eu não gosto de ficar tocando sozinho. Eu só gosto de tocar quando há música.


Starr: Se eu for treinar com você a noite toda ou por conta própria, vou ficar, tipo: "Ah, não é disso do que se trata”. Mas quando estou fazendo shows e as pessoas levantam os seus filhos de 07 anos, dizendo: “Este é o meu filho e se chama Tommy! Ele te ama e está fazendo aulas de bateria”. Eu sempre procuro falar: “Espero que ele não esteja estudando demais!”



Grohl: Mudando de assunto, explique o seu novo livro.


Starr: Se chama "Another Day in The Life", que é uma expressão que todos conhecemos e amamos. O que você faz nas turnês, quando está em períodos de inatividade?



Grohl: Honestamente, sento no meu quarto de hotel e fico compondo músicas.


Starr: Ok, bem, eu sento no meu quarto de hotel e tiro fotos de colheres e as coloco no meu livro, tiro fotos de uma águia que pousou na minha sacada, fotos de restos de comida, tipo, o que estiver acontecendo no momento.



Grohl: Creio que algumas pessoas nascem com um espírito criativo inquieto.


Starr: Um gene.



Grohl: Um gene, sim, eu sempre fui assim. Quando era jovem, saía para o quintal, encontrava pedaços de paus de madeira e fazia essas estradas elevadas para os carros andarem por cima, sabe? Aprendi a gravar multi-faixas no meu toca-fitas, pegava uma fita e gravava uma parte da guitarra e depois pegava a fita, rebobinava e colocava para tocar, enquanto gravava uma faixa de bateria com colheres de pau e panelas em outro toca-fitas, então, eu sempre fui assim. Eu apenas me sentia como uma criança hiperativa que só precisava fazer algo o tempo todo.


E honestamente, somos parecidos dessa maneira. Eu trabalhava em um armazém de móveis, tipo, nunca imaginei que me tornaria um músico famoso. Eu tocava em bandas de garagem, pegávamos a estrada e quando voltava para casa, implorava para ter de volta o meu trabalho no armazém, sabe? Voltava para esta fábrica de móveis e ficava feliz com isso. Então, quando a coisa toda do NIRVANA explodiu, um dos meus primeiros sentimentos foi: "Cara, não preciso mais desse emprego..."


Starr: Aposto que os seus pais falavam: “Volte para a fábrica!” Mas uma coisa você não sabia na época, que este 1º disco de sucesso que você havia gravado em 1991 ("Nevermind", 2º álbum do NIRVANA), poderia ter sido o primeiro e o último, você entende o que eu quero dizer?



Grohl: Sim, poderia ter sido!


Starr: A canção "Love Me Do" poderia ter sido o primeiro e o último single dos BEATLES, mas continuamos. Isso que há entrevistas nossas daquela época, dizendo: "Bem, você sabe, provavelmente a banda durará cerca de 04 anos apenas".



Grohl: Quando o meu 1º cheque de pagamento chegou através do NIRVANA, o meu pai havia me dito: "Você compreende que isso não vai durar, certo? Você tem que tratar cada cheque que receber como se fosse o último que irá receber". Ele me assustou, sabe? E funcionou!


Ringo, o que você achou quando ouviu NIRVANA pela 1ª vez?


Starr: Absolutamente ótimo e Kurt Cobain tinha muita emoção nele. Isso era o que eu mais gostei da banda, tipo, eu sou um cara emocional e ninguém pode duvidar do NIRVANA, nunca. E se Kurt estivesse vivo, quem saberia que ele terminaria onde ele acabou? Não acho que alguém que ouça música com bravura possa duvidar dele, porque ele foi corajoso na música.


Não conheço a história final dele e o que vou falar agora não é sobre ele, tipo, desde cedo, perdemos muitas pessoas em nosso ramo, certo? E você pensa: "Quão cruel estava sendo para ele em vida?" ou "Por que ele não me chamou pedindo ajuda?" Você nunca vai saber dessas coisas... No caso de Kurt, esta é a famosa síndrome dos 27 anos. Muitos artistas passaram dos 27 anos, mas aqueles que se foram com esta idade, tipo, o quê? Eles tinham entendido tudo sobre a vida até então? Ou talvez foi assim que Deus planejou para eles? Eu não sei...


Quando John Lennon foi morto, eu estava nas Bahamas. Eu recebi um telefonema dos meus parentes de Los Angeles, dizendo: "Algo aconteceu com John". E então, o pessoal da gravadora me ligou e disseram: "John está morto". Eu não sabia o que fazer. Só estava convencido de que algum bastardo atirou nele, mas apenas falei para a minha família: "Temos que pegar um avião". Chegamos em New York e não sabia o que poderia fazer. Nós fomos para o apartamento e perguntei para Yoko Ono: “O quê podemos fazer?” E Yoko apenas me disse: “Bem, fique brincando com Sean, mantenha-o ocupado”. E foi isso que fizemos e é isso que você pensa na hora: "O que eu faço agora?"


O interessante é que esse cara, Jack Douglas (produtor), me mostrou essa canção de John Lennon para mim, "Grow Old With Me", retirada das demos que John havia gravado e se chamava "Bermuda Tapes", de 1980. Foi só agora neste ano que ele me mostrou isso e eu nunca tinha escutado antes, cara... Então, John ainda está na minha vida e consequentemente está também no meu novo álbum, mas o motivo dele ter me dado essas gravações, é porque no começo é possível escutar John falando: "Ah, isso seria ótimo para Richard Starkey" (nome real de Ringo Starr).



Grohl: Nossa! Você nunca tinha escutado antes?


Starr: Eu me levanto da cadeira toda vez que penso nisso, sabe? Porque ele está falando de mim! Seria como ele dizendo para mim se eu estivesse lá: "Hey, Ringo, isso seria ótimo para você". Mas eu não posso mais ajudar ele... Comecei a engasgar agora e estou muito emocionado, porque estou pensando nele há 40 anos falando e pensando sobre mim em sua fita cassete... Nós 04 éramos grandes amigos com algumas questões secundárias a lidar... Enfim, eu não sabia como agir quando estávamos em New York quando ele faleceu e voltei sofrendo para Los Angeles. É claro que você sempre passa pelas fases do luto.


E quando George Harrison faleceu foi a mesma coisa... Estou chorando agora e com a voz trêmula, por isso que eu sou um velho bebê chorão. Ele já estava lá deitado na cama e muito doente - e não fazia muito tempo que ele estava assim... Eu tinha que pegar um avião para Boston, porque a minha filha iria entrar na sala de cirurgia, sabe? E então, eu disse para ele: "Bem, você sabe, eu tenho que ir embora, George", e ele me respondeu: "Você quer que eu vá com você?" Cara, você sabe, ele estava morrendo aos poucos e ele ainda me pergunta: "Você quer que eu vá com você?” Quantas pessoas no mundo dizem grandes coisas assim para você, realmente se doando?



Grohl: E no seu novo álbum, Paul McCartney toca nessa música de John Lennon, "Grow Old With Me".


Starr: Bem, eu queria isso. Paul esteve em 05 ou 06 discos meu. Se ele está na cidade, ele vem e toca, porque ele toca muito bem, certo? E eu pensei que a presença dele aumentaria a emoção dessa música. O ponto interessante é que o produtor Jack Douglas queria colocar uma orquestra nesta canção e eu disse: "Não, só o quarteto será suficiente". Então, John compôs, Paul e eu estamos lá tocando e Jack fez um riff muito famoso de George Harrison.


Mas Dave, nas poucas ocasiões em que você tocou as músicas de Kurt desde a morte dele, ajudou a processar a sua perda?



Grohl: Bem, quando Kurt morreu, percebi que não havia maneira certa ou errada de lamentar. Te leva a curvas engraçadas na vida, você fica entorpecido em alguns momentos e vai se lembrando das coisas boas, depois, se vira para o outro lado e começa a se lembrar de alguns tempos sombrios. Fiquei longe da música por um tempo, tipo, eu não escutava nem a rádio, sabe? E então, finalmente percebi que a música era a única coisa que realmente me fazia sentir melhor e iria me ajudar com isso... Comecei a compor canções e gravá-las sozinho.


E também é difícil quando um dos seus amigos ou alguém com quem você é muito próximo na vida real, depois de morto se torna algo a mais que um ser humano para os outros. Então, você se senta para fazer uma entrevista e alguém faz essas perguntas que são realmente emocionais, que você nunca faria a outro estranho qualquer.


Starr: Sim.



Grohl: Tipo, nenhum estranho chega até você e lhe pergunta: "Como você se sentiu quando o seu irmão morreu?" ou "Como você se sentiu quando algum membro da sua família morreu?" Não é algo que você perguntaria para alguém que acabou de conhecer, certo? Foi difícil por um tempo, mas percebi que era importante continuar com a vida e o que salvou a minha foi a música. Mais do que algumas vezes antes disso, a minha vida foi salva ao tocar música.


Não toquei mais essas músicas do NIRVANA do que poucas vezes nesses quase 26 anos. De certa forma e infelizmente, elas estão fora dos limites para serem tocadas todo tempo. Houve algumas vezes que tocamos, como no Rock'n Roll Hall of Fame em 2014 (quando o NIRVANA foi eleito) e num show em 2018 no Cal Jam Festival, California. É uma sensação engraçada, porque parece que você voltou com os seus amigos de banda, mas há algo faltando... Tipo, uma vez nós gravamos uma música com Paul McCartney em 2012 - eu, Pat Smear e Krist Novoselic - que foi a canção "Cut Me Some Slack". E foi uma viagem para nós 03 tocarmos juntos novamente desde 1994, mas na hora pareceu tão fácil, sabe? Algumas batidas e parecia o NIRVANA quando Krist e eu tocávamos juntos. Ninguém mais faz esse som e então, nos primeiros 20 minutos, estou novamente tocando com Krist e Pat e é como um sonho. Só depois que eu percebi: "Oh, espere, Paul também está aqui!"


Como é tocar com Paul McCartney?


Starr: Ah, ele é um baixista incrível. O baixista mais melódico e inventivo que já conheci.



Grohl: É engraçado, porque nas poucas vezes em que eu toquei com ele, acho que as pessoas esquecem da sua musicalidade porque ficam muito impressionadas por estarem ao lado de um beatle. E então, ele começa a tocar o seu instrumento e você fica, tipo: "Jesus, ele é bom pra caralho mesmo!". Ele realmente é o que é, quero dizer, a linha do baixo da música "Hey Bulldog" dos BEATLES... O que é isso, cara?


Starr: De onde isso veio?



Grohl: Eu não sei! Do espaço exterior... É uma loucura.


Vocês dois têm talento para compor partes de bateria extremamente cativantes. Quando você está criando, pensa nelas para se tornarem quase como "ganchos" musicais?


Starr: Eu não sei onde senti a necessidade de criar a batida da canção "Come Together", por exemplo... É como, onde você conseguiu isso? Eu não sei! Mas funcionou. E me lembro de John falando para mim: "Oh! Está ótimo".



Grohl: Acho que a bateria é importante porque você se conecta com alguém que não faz a menor ideia de como tocar o instrumento, mas que mesmo assim está imitando no ar o jeito que você está tocando, causando uma impressão neles de uma maneira tão musical quanto cantando uma música.


Eu conheço uma pessoa e prefiro não citar o nome dela, que me disse uma vez: "Mas tocar bateria não é composição". E eu lhe respondi: "Foda-se! Por que não?"


Quando estávamos ensaiando a música do NIRVANA, "Smells Like Teen Spirit", ninguém me disse como eu deveria toca-la e agora, sempre que alguém ouve a introdução da bateria nesta canção, ficou uma marca registrada à música. Eu acho que tocar bateria é muito importante, mais do que qualquer tipo de proficiência técnica, para que seja tão melódico ou musical quanto todos os outros instrumentos. Só você fazendo a batida da canção "Come Together" em cima da mesa como você acabou de fazer, todos já sabem qual música é!

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